Por LUSA
O Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, apelou hoje a que não se faça de “uma tragédia, que foi o assassinato bárbaro de dois compatriotas” um “rastilho para infligir mais sofrimento a outros compatriotas”, num discurso em Maputo.
“Não façamos de uma tragédia, que foi o assassinato bárbaro de dois compatriotas, repudiado por todos os moçambicanos, por todo o mundo, pelo Governo, não façamos isso um rastilho para infligir mais sofrimento a outros nossos compatriotas, que poderão ver limitada a sua busca diária e incessante do seu sustento”, afirmou o chefe de Estado moçambicano, num discurso no palácio presidencial em Maputo, depois de receber os representantes da Provedoria de Justiça do país.
Nyusi sublinhou que a justiça moçambicana não conhece ainda a motivação ou a responsabilidade do assassínio a tiro do advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane, Elvino Dias, e do mandatário do partido Podemos, Paulo Guambe, na passada sexta-feira à noite, no centro de Maputo.
“Não sabemos até agora qual a motivação e de quem é a responsabilidade. Não há que apressar isso para poder forçar algumas conclusões. Porque é que não esperam? E se não for essa linha que pensamos, como é que faremos? Recuamos e aquilo que foi destruído vai ser reposto”, questionou o Presidente, numa referência às manifestações e distúrbios ocorridos em Maputo nos últimos dias.
“Aguardemos os esclarecimentos sobre cada uma das mortes e a sua responsabilização”, apelou o chefe de Estado.
“Continuemos todos unidos pela nossa pátria, pois o Estado de direito sabe o que significa também o respeito pelas leis. O estado democrático é respeito pelas leis, isso é que é democracia. Democracia não é desobediência”, reforçou Nyusi.
Na sequência do duplo homicídio, Venâncio Mondlane convocou marchas pacíficas em Moçambique, na segunda-feira, que foram dispersadas por forte atuação da polícia, com tiros para o ar e gás lacrimogéneo, e os confrontos provocaram, segundo fonte hospitalar, pelo menos 16 feridos em Maputo.
A resposta policial às manifestações foi condenada pela comunidade internacional e houve vários apelos à contenção de ambas as partes, nomeadamente de Portugal, da União Europeia e da União Africana.
No que concerne às manifestações e distúrbios motivados pela contestação dos resultados preliminares das eleições até agora anunciados e às acusações de fraude eleitoral, sobretudo por parte de Venâncio Mondlane e do partido que o apoia, o Povo Otimista para o Desenvolvimento de Moçambique (Podemos), o Presidente moçambicano sublinhou que “o processo eleitoral ainda está em curso e corre em simultâneo a parte executiva do processo e a judicial”.
“Está tudo acautelado”, garantiu Nyusi, explicando através de uma metáfora que o processo tem duas vias paralelas, que decorrem em simultâneo, e que qualquer problema numa delas faria “disparar o fusível através da lei”.
Esta contestação antes de tempo, afirmou o chefe de Estado, “inquieta os moçambicanos e todos os homens de bem no mundo. Estou a receber chamadas de amigos, de colegas, de empresários, de agentes económicos em todo o mundo”, disse.
“Inquieta a instigação de que o país vai voltar para os dias 24 e 25 de outubro (quando os resultados finais oficiais deverão ser conhecidos) para reivindicar um processo que ainda não teve o seu desfecho nas instituições apropriadas. Como é que alguém sabe que perdeu ou ganhou, se ainda as coisas não estão ditas? Qual é a mensagem que estamos a transmitir sobre uma coisa que não foi dita”, questionou.
Nyusi lembrou que disse no dia em que votou que “o jogo termina depois dos 90 minutos”, descrevendo em seguida os procedimentos de contestação à disposição de uma qualquer equipa de futebol descontente com uma decisão ou resultado. “É assim que se faz, não é com pancadaria”, concluiu, numa alusão aos distúrbios de segunda-feira em Maputo.
“Por isso, refiro-me designadamente à CNE (Comissão Nacional de Eleições), que deve anunciar (os resultados); aos tribunais judiciais de distrito e mesmo declarados (os resultados) pelos órgãos que acabei de referir, a última instância decisora é o Conselho Constitucional”, afirmou.
“Ainda nem chegámos lá, não sabemos qual é o receio de aguardar a decisão ou qual é a motivação, seja nacional ou internacional, de criar perturbações, protestar ilegalmente”, prosseguiu Filipe Nyusi, para em seguida acusar a manipulação da juventude por parte dos organizadores dos protestos: “Qual é o receio de protestar legalmente, como a lei orienta, em vez de agitar a juventude, e portanto, a ordem e a estabilidade de todos os moçambicanos”.
O Presidente sublinhou que houve “queima de pneus e vandalizações, registaram-se alguns confrontos entre manifestantes e a polícia usando pedras e outros instrumentos contundentes” e que a Polícia da República de Moçambique (PRM) foi obrigada a recorrer ao uso de meios de controlo de massas”.
“Não estou a por em questão como foi usado, mas foi usado. Os confrontos provocaram alguns ferimentos em alguns membros da PRM de Moçambique e (ficaram) feridos mais de uma dezena de cidadãos que foram socorridos nas unidades sanitárias”, afirmou, para em seguida questionar o “porquê” da situação.
Sobre o uso inadequado dos “meios de controlo de massas” pela polícia moçambicana, Nyusi reconheceu que “no decurso das manifestações, alguns parceiros da comunicação social que cumpriam o seu dever de informar e comunicar aos moçambicanos, no meio dos manifestantes, acabaram sendo atingidos pelos meios usados”.
“Nós lamentamos este facto profundamente”, afirmou.