Por LUSA
Os juristas guineenses Fodé Mané e Luís Peti manifestaram estranheza pelo facto de não ter sido condenado nenhum cidadão do país no processo da aterragem no aeroporto de Bissau de uma aeronave com mais de 2,6 toneladas de droga.
Em declarações à Lusa, os dois juristas saudaram a decisão do Tribunal Regional de Bissau (TRB) ao condenar a penas de 17 anos os cinco cidadãos estrangeiros que transportaram a aeronave do México até o aeroporto internacional Osvaldo Vieira de Bissau, mas não compreendem que a decisão não tenha atingido nenhum guineense.
“O mais caricato é o facto de o processo ter sido conduzido pela Polícia Judiciária e posteriormente pelo Ministério Público e não ter sido indiciado nenhum guineense nesta operação”, observou Luís Peti, um conhecido comentador de assuntos jurídicos na Guiné-Bissau.
Os cinco estrangeiros, um cidadão da Colômbia, um do Equador, dois do México e um do Brasil, foram detidos no aeroporto de Bissau, no dia 07 de setembro de 2024 e o TBR condenou-os, na última segunda-feira, a 17 anos de prisão efetiva, por crimes de coautoria de “tráfico de substâncias estupefacientes agravado”, e “utilização ilícita de aeronave”.
O tribunal deixou cair a pretensão do Ministério Público que queria que fossem também condenados por crime de associação criminosa e ainda queria que as penas chegassem a 20 anos de reclusão.
Docente universitário e ativista pelos Direitos Humanos, Fodé Mané disse ter ficado “intrigado” quando viu que no acórdão das condenações não constava o nome de nenhum guineense que, notou, podia ser condenado por outros crimes.
“Podia ser, não por tráfico, mas por negligência, porque isso mostra que o nosso espaço aéreo, o nosso território, está inseguro, pode ser (invadido) a qualquer momento. Ficou por esclarecer, portanto eu acho que o próprio processo, no seu todo, deixou muita coisa por esclarecer”, defendeu Mané.
Luís Peti considerou que o Ministério Público e a própria Polícia Judiciária tinham “todos os elementos” para citarem os técnicos do aeroporto de Bissau no processo em termos de responsabilização.
O também advogado notou que nenhum avião aterra no aeroporto internacional de um país sem uma autorização prévia, sem que se saiba o destino, a carga que o aparelho transporta.
Se estes procedimentos não forem respeitados, Luís Peti entende que a situação “é ainda muito mais grave”. Os suspeitos disseram no tribunal que aterraram em Bissau numa situação de emergência devido à falta de combustível que o levasse para o Mali, que era o destino do voo.
“A Polícia Judiciária e o Ministério Público alegam que não há nenhum guineense envolvido. É o que realmente estranha a toda a gente. Porquê, de eventualmente, encobrir este facto”, questionou Peti.
Fodé Mané, por sua vez, até entende os juízes que decidiram o caso em julgamento, mas já não compreende a “falta de meios de investigação” por parte do Governo, situação que, disse, acabou por dificultar que o Ministério Público fizesse o seu trabalho.
Mané, que considerou a pena de 17 anos de prisão efetiva aos cinco estrangeiros “branda”, não aceita a argumentação do tribunal sobre ausência de associação criminosa no processo.
O jurista defendeu que por serem pessoas de países diferentes e que se juntaram para realizar uma operação internacional de tráfico de droga, de um continente para outro, o tribunal deveria acolher a dedução feita pelo Ministério Público e determinar a condenação por associação criminosa.
O tribunal absolveu os cinco condenados da prática de crime de “associação criminosa”, por considerar que não ficou provado, no julgamento, que houvesse uma “hierarquia ou estrutura organizatória” entre os suspeitos.
“Houve associação para atingir um objetivo que é transportar a droga para a Guiné-Bissau”, sustentou Fodé Mané.