Por LUSA
Antigos combatentes portugueses estão a revisitar lugares onde estiveram na Guiné-Bissau, durante a guerra colonial, numa “romagem da saudade” a um passado com mais de 50 anos, de uma vida que, dizem, ficaria incompleta sem este regresso.
Esta foi a primeira visita à antiga colónia portuguesa para quase todos os seis ex-combatentes que a Lusa encontrou em Bissau, cumprindo “uma vontade de regressar difícil de explicar”.
Depois de 24 meses de serviço, entre agosto de 1971 e agosto de 1973, saíram da Guiné num ambiente ainda de guerra e regressaram, 51 anos depois, num ambiente de paz.
Faziam, todos, parte da mesma companhia, comandada por Filipe Lopes, durante a guerra colonial, e regressaram juntos para revisitar a Guiné, nesta que chamam “uma romagem da saudade”.
As motivações são “algumas”, desde logo porque ficaram a gostar da Guiné, apesar da guerra que ali viveram na juventude dos 20 anos.
As “pequeninas” alterações que encontraram são “bastantes agradáveis”, para Filipe Lopes, como o à vontade com que andaram nas ruas de Bissau, onde constataram que “a população é extremamente amistosa” com os portugueses.
Esperavam, contudo, “ver a Guiné mais desenvolvida” do que está hoje.
Fernando Ansiães “andava a sonhar há muito tempo voltar, porque há sempre aquela saudade, mesmo dos momentos difíceis da vida”.
O ex-combatente matou saudades dos sítios mais marcantes, como Buba e Bolama, e lamentou a “desolação de encontrar Bolama como está”, com tudo destruído.
Carlos Henriques, o dinamizador desta viagem, é a segunda vez que visita a Guiné, depois da guerra, e foi a primeira visita que o levou a desafiar os restantes amigos, num almoço da companhia.
“Nesse almoço, eu senti dos meus companheiros uma certa necessidade, falavam com saudade”, contou, explicando que foi assim que decidiram viajar juntos.
Com sentimentos mistos de “alegria” e frustração, garantem que foram “muito bem recebidos”,
“Para mim, foi um prazer, a população muito amistosa, um contacto pessoal com ela muito amigo, muito positivo, uma empatia grande, apenas triste porque a Guiné-Bissau não cresce”, referiu Carlos Henriques.
Encontraram um antigo combatente do lado oposto, trocaram algumas impressões – e alguns mimos -, recordaram situações do teatro de guerra.
Não foi o sonho ou a necessidade que levou Pinto Carvalho de volta à Guiné, mas “a saudade de facto dos 20 anos, da juventude de quando” lá estiveram.
Foi movido, disse, por “um sentimento mais de curiosidade, de voltar a pisar os sítios” onde esteve e saber como é que as coisas se encontram.
“Comungo de alguma desolação ao ver os cenários, mas eu tive uma confirmação de que esta terra é para os guineenses, esta terra é para os africanos, têm a sua cultura, a sua forma de viver”, afirmou.
O que agradou a este antigo combatente “foi continuar a ouvir falar português nestas terras” e o que leva desta visita é “exatamente a confirmação da inutilidade da guerra”.
José Pereira “esperava muito mais”, cinquenta anos depois, do que o que encontrou, por exemplo, em Buba, onde havia praticamente o quartel e onde agora existe uma rede escolar com 1.800 alunos, a quem falta tudo: “luz, água, computadores, não têm nada”.
“Estas crianças merecem muito”, disse, emocionado e mais apaziguado com a explicação de que na Guiné-Bissau não há meninos de rua, há meninos na rua, mas que estão acolhidos, têm família, casa.
O que não encontraram foi ressentimentos, “mesmo no encontro com um antigo adversário”.
Trocaram contactos e de Portugal vão enviar fotografias da época. José tem “umas centenas ou milhares” de 1971, que vai partilhar com os guineenses.
Os antigos combatentes vão “espantados” com o que viram na avenida principal de Bissau, uma classe média que não existia antigamente e a beleza das vestes e da mulher guineense.
João Cartaxo também concretizou uma aspiração que sempre o acompanhou.
“A minha primeira impressão foi alguma frustração, sobretudo, da parte histórica da cidade de Bissau, extremamente abandonada. Essa frustração acentuou-se com a ida a Bolama, antiga capital”, contou.
Entre as coisas boas que encontrou reforça “a afabilidade e simpatia e disponibilidade da população”, que o impressionou e emocionou.
“Vou de alma cheia, a idade não sei se me permitirá cá voltar, mas vou com saudades. A minha vida ficaria incompleta se cá não tivesse vindo e, portanto, isso eu tinha que o fazer”, partilhou.