Por LUSA
O escritor e consultor do Governo de Cabo Verde e do Banco Mundial José Luís Mascarenhas lamentou hoje que o arquipélago tenha afunilado todo o destino turístico para apenas duas ilhas, criticando o “monoproduto sol e praia”.
“Cabo Verde afunilou todo o setor do turismo para o monoproduto de sol e praia, e também para o monodestino do Sal e Boavista, o que levou a uma concentração excessiva do turismo nestas duas ilhas, onde 10% da população acolhe cerca de 93% do negócio do turismo, deixando apenas 7% para as outras oito ilhas”, disse José Luís Mascarenhas.
Em declarações à Lusa no dia do lançamento do livro ‘Crónicas das Ilhas: Ambição 2030′, que resulta de 30 crónicas emitidas na Rádio Cabo Verde, o autor diz que a predominância turística do Sal e Boavista “obrigou a população a deslocar-se para ir ter com o desenvolvimento, quando devia ser o desenvolvimento a ir ter com as populações nos seus lugares, e criou problemas a nível de sustentabilidade, socioculturais, económico e proliferação de bairros de lata, com o bairro da Boa Esperança ou bairro da Boa Terra”.
Dividido em três partes, o livro que tem prefácio do Presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, aborda os desafios globais, as soluções locais e um grande ’tour’ pelas ilhas, disse o autor à Lusa, vincando que Cabo Verde tem dificuldade nos três pilares que sustentam a indústria do turismo.
“Temos problemas no produto, na distribuição junto dos mercados emissores e no transporte, temos de desenhar um produto que não seja herdado da natureza, como acontece com o ‘sol e praia’; o grande desafio é desenhar um novo produto turístico que exige uma interligação multidisciplinar, mas Cabo Verde apresenta muitas dificuldades em associar a ciência à política”, disse o autor, defendendo consensos alargados no país.
Questionado sobre qual seria esse novo produto, José Luís Mascarenhas respondeu: “Cabo Verde é mais forte naquilo que tem de exclusivo, e o que tem de exclusivo é o homem cabo-verdiano, na sua forma de ser, de sentir, de agir, a cultura, e se soubermos ‘vender’ o homem cabo-verdiano, o país, em vez de ser um pequeno Estado insular, pode ser uma superpotência, porque poucos têm a diversidade e a riqueza que a cultura de Cabo Verde tem, e é exclusivo”.
José Luís Mascarenhas sustentou ainda que houve falta de planeamento estratégico nas últimas três décadas no setor do turismo: “Cabo Verde escolheu o turismo como setor estratégico, mas em três décadas não houve planeamento estratégico, existe um conjunto de questões que ficou por resolver, e os planeamentos estratégicos não dão resposta à capacidade de carga de cada ilha, à utilização dos recursos estratégicos, à vocação de cada ilha e ao papel do empresariado nacional e do investidor externo, o que provocou um pseudoconflito entre competitividade e sustentabilidade turística”, concluiu.
O setor do turismo é uma das principais fontes de riqueza de Cabo Verde, responsável por cerca de 25% do Produto Interno Bruto (PIB), concentrado nas ilhas do Sal e da Boavista.
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